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09/05/2016
‘Esqueletos’ deixados pelo governo Dilma podem passar de R$ 250 bilhões

09/05/2016

Eventual governo Temer vai herdar uma conta ‘oculta’ que inclui possíveis capitalizações de estatais, perdas na negociação da dívida dos Estados e em fundos públicos; estimativas menos conservadoras apontam que buraco chegaria a R$ 600 bi.

Já se sabe que um eventual governo de transição terá de administrar um déficit monumental para ajustar o orçamento público. O buraco pode ir a R$ 360 bilhões. Quem acompanha o funcionamento da máquina pública, porém, lembra que há outra conta, essa oculta, mas igualmente expressiva, de “esqueletos” que podem ser herdados da gestão de Dilma Rousseff. Como se tratam de gastos desconhecidos até que sejam devidamente contabilizados, vivem no terreno das estimativas. 
Numa projeção conservadora, feita por especialistas de diferentes áreas, a pedido do Estado, a conta pode passar de R$ 250 bilhões. Mas há quem diga que pode ser ainda maior. Em relatório, a agência de classificação de risco Moody’s estimou que, no pior cenário, a conta vai a R$ 600 bilhões. 
O que popularmente se chama de esqueleto, na literatura econômica é chamado de gasto contingente: despesa excepcional gerada por derrapadas na gestão da política econômica que fica escondida até que exploda ou que alguém jogue luz sobre ela. Para os especialistas em contas públicas, essa despesa tende a proliferar. “Tem uma coisa que precisa ficar clara: a dinâmica do gasto social, do gasto com previdência, do gasto com pessoal, tudo isso, é muito previsível. Não há surpresa. A gente conhece e não deixou esqueletos. Mas a política setorial deixou”, diz o economistas Mansueto Almeida, especialista em contas públicas.
As estimativas de gastos extras feitas a pedido da reportagem incluem eventuais capitalizações que o Tesouro tenha de fazer nas estatais Petrobrás, Eletrobrás e Caixa Econômica Federal, a negociação das dívidas dos Estados, que vão gerar perdas para a União, o risco de inadimplência com o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), e a manutenção do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). 
Estimativas
A agência de risco Moody’s dedicou um relatório inteiro à discussão dos passivos contingentes no Brasil observando apenas os grandes desembolsos que podem vir pela frente. Pelas suas estimativas, ao longo dos próximos três anos, os gastos extraordinários podem variar entre 5% e 10% do PIB, o Produto Interno Bruto: algo entre R$ 295 bilhões e R$ 590 bilhões. Como esse tipo de gastos afeta o fôlego financeiro da União, a Moody’s estimou que os gastos levariam a dívida – hoje perto de 70% do PIB – para 90% do PIB em 2018. 
A agência avaliou que há possibilidade de o governo socorrer tanto a Petrobrás quanto a Eletrobrás, porque ambas estão sob pressão financeira (leia mais abaixo). Entre 2016 e 2018, apenas a Petrobrás demandaria cerca de R$ 300 bilhões – mais de R$ 100 bilhões apenas para pagar dívidas. 
A agência analisou também a saúde dos bancos públicos: Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Considerou que a Caixa é a instituição mais sensível a um eventual socorro (leia abaixo). Hoje, a Moody’s não vê risco no segmento, mas, se houver deterioração e estresse das instituições, o passivo contingente tende a explodir, indo a R$ 600 bilhões. 
A agência considerou também o custo da renegociação da dívida dos Estados. Apesar de tecnicamente não serem enquadrados como passivos contingentes, no sentido mais clássico do conceito, as dívidas estaduais vão gerar uma conta extra para o governo federal que vai impactar a formação de superávit e pesar sobre a dívida. 
Neste momento é muito difícil prever o tamanho da conta dos Estados. Pedro Jucá Maciel, assessor parlamentar de Assuntos Econômicos no Senado, lembra que ela pode ir a R$ 402 bilhões se o Supremo Tribunal Federal aceitar a tese de que é preciso trocar o indexador da dívida de juro composto para juros simples. O julgamento está suspenso até junho. 
A secretária de Fazenda de Goiás, Ana Carla Costa, lembra que nesse meio tempo a União já está perdendo. Os Estados que ganharam liminares vem reduzindo os pagamentos à União. Apenas em abril o governo não recebeu R$ 2,6 bilhões. “Se prevalecer o que consta no Projeto de Lei Complementar que trata do tema (e inclui alongamentos para pagar a União e o BNDES, mais desconto temporário), o caixa federal deixaria de receber R$ 51 bilhões entre 2016 a 2018”, diz ela . 
A situação econômica do País é tão crítica, que os economistas têm dificuldade de bater o martelo até para qual será o tamanho do buraco nas contas conhecidas. O economista Samuel Pessôa lembra que para cobrir o déficit do ano passado e fazer um superávit, para que a dívida fique estável, seriam necessários R$ 360 bilhões. “Mas alguns colegas dizem que se fosse descontada a piora do cenário, bastariam R$ 150 bilhões.”
Estatais precisariam de, no mínimo, R$ 150 bilhões
No mercado, já é dado como certo que Petrobrás e Eletrobrás vão precisar de aporte do Tesouro. As estimativas em relação às cifras, porém, não são nada consensuais, especialmente para a petroleira. 
A estatal teve várias perdas. Perdeu com a corrupção, investigada na Operação Lava Jato. E viu o caixa sangrar no período em que o governo de Dilma Rousseff, para controlar a inflação, impediu os reajustes do combustível no mercado interno, enquanto pagava caro por ele no mercado internacional. Com a queda no preço do petróleo, os custos para a exploração do pré-sal vão se tornando impeditivos. 
Alguns acreditam que Petrobrás vai precisar ao menos de R$ 100 bilhões para quitar as dívidas que vencem neste ano e no próximo. Entre 2016 e 2019, vencem R$ 252,9 bilhões em dívidas. Outros projetam que a conta vai passar de R$ 200 bilhões para que a estatal consiga estabilizar a relação entre dívida e Ebitda (índice que mede o peso do endividamento olhando quantos anos de geração de caixa são suficientes para quitar os débitos). No último balanço, estava em 5,3 anos, mais que o dobro dos 2,5 palatáveis para uma companhia de seu porte. A Moody’s, em relatório que avalia eventuais passivos contingentes no Brasil, estimou que nos próximos três anos a Petrobrás pode demandar aportes equivalentes a 5,6% do Produto Interno Bruto (PIB): cerca de R$ 330 bilhões. 
Fontes próximas à diretoria, que não querem ter o nome revelado, afirmam que a Petrobrás tem condições de seguir adiante “sem um tostão do Tesouro”. O argumento: implementou um agressivo plano de vendas de R$ 14 bilhões em ativos e tem “convicção” de que vai conseguir cumpri-lo. Na semana que passou, a empresa anunciou a venda de US$ 1,3 bilhão em participações em subsidiárias no Chile e na Argentina. 
Energia
O valor da capitalização da Eletrobrás seria mais baixo, mas não menos expressivo: ficaria próximo de R$ 50 bilhões, estimam fontes ligadas à empresa. A estatal já vai receber R$ 1 bilhão e pleiteia outros R$ 5,9 bilhões de aportes previstos no orçamento. A Eletrobrás tem perdas recorrentes com distribuidoras no Norte e Nordeste. Os acionistas minoritários querem que elas sejam vendidas, mas a proposta não avança porque o acionista controlador, a União, é contra.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Petrobrás preferiu não se manifestar. A assessoria da Eletrobrás disse que a estatal não comenta especulações (O Estado de S.Paulo, 9/5/16)

 

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